CARTA À IGREJA QUE ESTÁ
EM ÉFESO
Se a tradição que diz que João foi bispo na cidade
de Éfeso é correta, sua pulsação deve ter acelerado quando ouviu que a primeira
das sete cartas destinava-se exatamente à igreja em Éfeso.
Podemos ver nos livros de Atos e Efésios que a
igreja do Novo Testamento era caracterizada tanto pelo amor como pelo zelo.
Como a cidade de Éfeso tinha a pretensão de ser a "metrópole", ou
"cidade mãe" de toda a Ásia, dava à igreja em Éfeso, pelas suas atividades
evangelísticas e cuidado pastoral, o direito de pretender o título de igreja
mãe da província. É por isso que o apóstolo Paulo pôde escrever acerca"...
do amor para com todos os santos", manifesto pela igreja de Éfeso (Ef
1:15).
Na época em que João escreve, alguns anos já se
passaram. Como estaria a igreja? O zelo parece não ter diminuído. As obras, o
labor e a perseverança são louvados e, em especial, o valor que a igreja dava à
sã doutrina. Embora a igreja suporte o sofrimento, é patente que não pode
suportar o ensino falso, venha ele de homens perversos, pseudo-apóstolos, ou de
nicolaítas em particular.
Éfeso era uma igreja que tinha levado a sério as
advertências de Paulo quando do seu último encontro com seus líderes. Da mesma
forma, a mensagem de Cristo não menospreza o cuidado deles pela pureza e o amor
pela verdade Mas, na busca constante pela preservação da verdade, a igreja em
Éfeso tinha perdido o amor,
"qualidade sem a qual todas as outras não têm sentido".
É digno de nota o fato de que somente na primeira e
na última das sete cartas as igrejas são ameaçadas de completa destruição, pela
desanimadora, e puramente negativa, razão que é a falta de fervente devoção. "Tenho, porém, contra ti que
abandonaste o teu primeiro amor", diz Cristo. Vê se me compreendes: “...
odeias as obras dos nicolaítas as quais eu também odeio"; a teu favor tens
teu zelo. Mas onde está o teu amor? Fica
sabendo que do amor depende a tua própria existência como igreja.
Este tipo de erro é muito fácil de acontecer. Deve
ser confessado por todos os cristãos que aceitaram o papel de bravos senhores
defensores da verdade, e esqueceram-se de que deles se espera que sejam
senhores de coração grande também.
À igreja de
Éfeso, Cristo mostra-se zeloso pelo que é certo. Demonstra poder e vigilância —
mas é a igreja que ele tem nas mãos e vigia. Também tem olhos perspicazes para
identificar o mal, mas é na igreja que ele o identifica. Também não pode
suportar o mal, porém o mal que ele ameaça destruir é a própria igreja, se ela não
se arrepender.
E, de fato, a primeira lâmpada do candelabro foi
removida. Tanto a igreja como a cidade foram destruídas; a única coisa que
restou foi um lugar chamado Agasalute, e isso, ironicamente, honra a memória de
João e não de Éfeso.
CARTA À IGREJA QUE ESTÁ
EM ESMIRNA
Ninguém precisa conhecer a história da cidade de
Esmirna para compreender a mensagem destinada a essa igreja, mas creio que é
elucidativo o fato de que a beleza dessa cidade, que até rivalizava com Éfeso,
era, por assim dizer, a beleza da ressurreição. Setecentos anos antes a velha
cidade de Esmirna fora completamente destruída, permanecendo em ruínas durante
três séculos. A cidade que existia nos dias de João era, por assim dizer, uma
cidade que havia ressuscitado. Em flagrante contraste com os campos existentes
hoje no local onde Éfeso existia, Esmirna permanece até hoje com o nome de
Izmir, sendo a segunda cidade da Turquia asiática. A ressurreição, que
caracterizava a cidade, haveria de marcar a igreja também.
O futuro imediato era de sofrimento e morte. Isso
era uma certeza; um fato que envolve inúmeras lições para nós que vivemos de
modo relativamente fácil nos dias de hoje. Como reagiríamos se amanhã a
perseguição batesse à nossa porta? Muitas igrejas aprenderam a viver debaixo
desta perspectiva e creio que devemos fazer o mesmo. A grande tribulação, vista
por João como o acontecimento final desta época, a qual ele próprio vê em
miniatura, aparecia como uma constante na experiência do povo de Deus. É uma
provação.
É a ação do diabo, mas serve aos propósitos e
intenções de Deus.
A perseguição em Esmirna foi especialmente intensa
devido ao fato de que a comunidade judaica local era o maior dos inimigos. Os
judeus eram o povo de Deus do
ponto de vista racial, mas não real (Rm 2:28), e de fato blasfemavam contra
Deus quando perseguiam a igreja sob a alegação de estarem prestando culto a
Deus (Jo 16:2). Foram talvez as pressões econômicas, exercidas por esses
judeus, que levaram a igreja à pobreza. Talvez fossem as acusações difamatórias
dos judeus que conduziram os cristãos à prisão e à morte.
Mas os cristãos não devem desanimar. O Cristo que
desvenda esta possibilidade desanimadora passou por uma experiência semelhante.
Como Esmirna, o Senhor “... esteve morto e tornou a viver" para garantir
que eles também tornariam a viver. Por trás daqueles judeus estava Satanás; seu
pai espiritual é o diabo e não Abraão (Jo 8:33,44). Mas Deus está por trás de
tudo e é ele que controla todas as coisas. Uma grande lição é que o sofrimento
é certo; outra, é que ele é limitado. Para a igreja de Esmirna a perseguição
seria por "dez dias", em um futuro não muito distante. Mas, pela
bondade de Deus, haveria o décimo primeiro dia e aí tudo estaria terminado. O
fato de Deus estar no controle não quer dizer que Satanás esteja impedido de
inflingir dor. Não há uma só passagem no Novo Testamento que prometa uma vida
isenta de sofrimentos, aliás, como é notório, sem cruz não há coroa. Mas o que
Deus garante é que, mesmo que a igreja venha a morrer no sentido físico, jamais
sofrerá o dano da segunda morte. É assim que Paulo, tendo aprendido dupla
lição, demonstra uma atitude verdadeiramente cristã face à tribulação:
"porque para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não
são para comparar com a glória por vir a ser revelada em nós" (Rm 8:18).
A mensagem, portanto, é que os crentes de Esmirna
não devem ser medrosos, mas fiéis. Não devem olhar para o
sofrimento, mas para Deus que tudo tem sob controle.
CARTA À IGREJA QUE ESTÁ
EM PERGAMO
Éfeso era a principal cidade da Ásia, mas Pérgamo
era a capital, pois era lá a sede do governo imperial.
Lá também havia o mais antigo templo dedicado à
prática da religião patrocinada pelo estado, a saber, a adoração do imperador.
Não sabemos com certeza se Cristo se referia a isso quando falou do "trono
de Satanás", mas sabemos o tipo de dificuldade que os cristãos em Pérgamo
tinham que enfrentar. Para eles, Satanás não era, como em Esmirna, um mero
caluniador trabalhando por intermédio de um grupo de judeus mal intencionados.
Satanás aparece como o "príncipe do mundo" segundo a expressão
literal do Evangelho de João (Jo 14:30); o que a primeira carta de João chama
de "o mundo" (1 Jo 2:15) é, de fato, o grande inimigo da igreja em
Pérgamo.
"O mundo" inclui o poder de outras
instituições além da máquina do Estado. Há a enorme biblioteca de Pérgamo (a
cidade devia o seu nome à palavra "pergaminho"), o ministério de cura
executado pelos sacerdotes de Esculápio e, servindo como coroa à acrópole da
cidade, o altar grego asiático de Zeus, o salvador. Toda essa parafernália de
uma "sociedade alternativa" orientada para as necessidades da mente,
do corpo e do espírito, é acrescentada às demandas do próprio estado romano. Da
mesma forma encontraremos na quarta cena a besta que sai da terra junto com a
besta que sai do mar, oferecendo ao homem um sistema de vida viável, fora do
reino de Deus. Mas esta é outra história. Antecipar o que João diz adiante é a
maneira mais eficiente de confundir as coisas.
Resumindo, Satanás trabalha em Pérgamo através das
pressões de uma sociedade pagã. Satanás persegue; o sofrimento que viria sobre
os cristãos de Esmirna já pairava sobre os de Pérgamo, e pelo menos um cristão
já havia sido martirizado. Ele segue; os nicolaítas que foram mencionados na
carta aos cristãos em Éfeso acham-se aqui novamente e, apesar de não sabermos
muita coisa a respeito deles, o seu ensino parece ser do mesmo tipo do de
Balaão, o qual havia conduzido o povo de Deus para o pecado em épocas passadas (Nm 31:16; 25:1-3). Creio que os dois pecados
mencionados no versículo podem ser entendidos
literalmente. Ambos aparecem nos dias de Balaão e reaparecem nos dias do Novo
Testamento (1Co 5 e 8). O caminho que conduz à prática desses pecados é o tipo
de tentação típica do mundanismo de todas as épocas: "que mal há nisso?
Todo o mundo faz, por que não você?"
Sedução ou perseguição é a dupla perversão que o
mundo oferece à igreja. Uma sociedade altamente permissiva pode ser
estranhamente severa para com todos os que se recusam a acompanhá-la. "Por
isso, difamando-vos, estranham que não concorrais com eles ao mesmo excesso de
devassidão" (1 Pe 4:4).
As ruas
alegres da Feira da Vaidade ainda podem conduzir à prisão ou à fogueira: ou
você compra, ou é queimado. Antipas, ao que parece, foi o único membro da
igreja em Pérgamo a sofrer o martírio. Mas o que o Senhor diz é importante:
"Não negaste a minha fé, ainda nos dias de Antipas". Negar a fé era
uma tentação constante, especialmente quando a outra opção era ser martirizado.
Para alguns a tentação é forte demais e por isso
cedem. O compromisso com o mundo se estabelece quase sem sentir. A distinção
entre a igreja e o mundo torna-se obscurecida. Há muita tolerância e pouca
disciplina. A culpa de Pérgamo residia no oposto da culpa de Éfeso; e quão
tênue é a linha entre o pecado da tolerância e o pecado da intolerância.
De qualquer forma, no fim, é com Cristo que eles
terão que prestar contas. O poder da espada não está com os governantes
romanos, nem com o príncipe deste mundo, mas com Cristo. A espada de dois gumes
certamente refere-se ao outro juízo que é necessário: discernir a verdade (Hb
4:12) e punir o mal (Rm13:4). O Senhor está pronto a usar a espada contra
aqueles que, mesmo na igreja, não se arrependam.
O Senhor faz, entretanto, uma promessa àqueles que
se arrependem e vencem. Não é fácil entender especialmente o significado das
pedrinhas brancas, apesar de haver várias opiniões a respeito. Desde que o
contexto fala de festas com carne sacrificada aos ídolos e da festa do maná que
Deus espalhou no deserto para Israel, a menção das pedrinhas pode se referir ao
antigo costume de utilizar pequenas pedras quadradas como ingresso nos
espetáculos públicos.
A promessa de vida eterna feita no final das duas
cartas anteriores é repetida aqui em termos apropriados ao cristão que não se
conforma com os prazeres do mundo, nem com os banquetes da carne sacrificada
aos ídolos. Cristo faz ao vencedor um convite pessoal para participar de um
banquete no céu, que consiste na comunhão com o próprio Cristo: "porque
quantas são as promessas de Deus tantas têm nele o sim"; e ele é o único e
verdadeiro maná, o pão da vida que desceu do céu (2 Co 1:20; Jo 6:31-35).
CARTA À IGREJA QUE ESTÁ
EM TIATIRA
Os pecados da igreja de Tiatira, assim como os de
Pérgamo, eram a imoralidade e a tolerância para com a adoração de ídolos. Tanto
nesta, como naquela igreja, podemos interpretar literalmente esses pecados, se
bem que eles caracterizam o adultério espiritual no qual o povo de Deus
incorria constantemente. De acordo com a metáfora bíblica, o verdadeiro Deus é
o esposo de Israel, e os falsos deuses são os amantes de Israel (Jr 3; Ez
16; Os 2). Tanto Jezabel como Balaão
foram estrangeiros que seduziram a noiva de Deus à prática desse tipo de
infidelidade (1 Rs 16:31; 2 Rs 9:22).
Há, no entanto, distinções entre as duas situações.
Contra os cristãos cercados de Pérgamo, Satanás usa a pressão do mundo tentando
comprimir os crentes "nos seus próprios moldes" (Rm 12:2). Mas onde a
igreja já se faz notar pelo crescimento e pelo vigor ele sabe que pode causar
um prejuízo maior envenenando o interior, do que pressionando o exterior.
Em Tiatira uma mulher assumia, ao mesmo tempo, o
perverso caráter de Jezabel e a atividade profética de Balaão, e ensinava, como
se fosse da parte de Deus mesmo, coisas novas e profundas que muitos membros
daquela igreja forte e dinâmica já estavam predispostos a explorar.
A glória de Cristo sonda a mente e o coração de
"Jezabel", e "nada refoge ao seu calor". Aqueles que não se
arrependerem são ameaçados com tribulações e morte, certamente de cunho
espiritual e, possivelmente tanto nestas punições como na punição pelos pecados,
com a morte física também. Àqueles que se arrependerem ele promete que, uma vez
removida a barreira do pecado, eles se transformarão na maravilhosa igreja
missionária que está dentro de Si mesmos.
CARTA À IGREJA QUE ESTÁ
EM SARDES
Apesar das falhas, Cristo reconheceu as coisas boas
existentes em todas as igrejas às quais se dirigiu. O que ele encontrou que
recomendasse Sardes? Nada. A única coisa boa que a igreja possuía era
uma boa reputação para a qual não existia, de fato, razão alguma. O veredito de
Cristo sobre a condição da igreja é breve e devastador: "Tens nome de que
vives e estás morto".
Não nos enganemos acerca de Sardes. Ela não é o que
o mundo chamaria de igreja morta. Talvez ela seja considerada viva até
mesmo pelas suas igrejas irmãs. De fato, desde que Cristo determina a igreja a
ser "vigilante" e a adverte de que a sua vinda para julgá-la será
inesperada, quer me parecer que nem a própria igreja tinha consciência do
estado espiritual em que se encontrava. Todos a reputavam como igreja
florescente, ativa e bem sucedida; todos, com exceção de Cristo. Suas obras não
atingiam o padrão estabelecido por Cristo. Ninguém naquela igreja tinha
atingido a integridade necessária.
Se Cristo ameaça não confessá-la diante de Deus a razão
é que, apesar de todo o seu ativismo, ela não está, de fato, confessando a
Cristo.
Falha na integridade? Falha na confissão? Ninguém
ficaria mais surpreso face às acusações do que a própria igreja. Mas
"quando nos lembrarmos do que a palavra integridade significava, no
sentido da vida cristã, aos cristãos em Esmirna, poderemos entender melhor o
que João requeria da igreja em Sardes": segura, contemplativa como a
cidade de Sardes, não sofria nem perseguições, nem heresias. Ela tinha imposto
a Si mesma a tarefa de evitar problemas, seguindo uma política baseada na
conveniência e na circunspecção ao invés de no zelo fervoroso.
Talvez não seja correto dizer que a sua reputação é
a única coisa boa que a igreja tem. Há algumas pessoas na igreja que ainda não
estão mortas embora estejam morrendo. Umas poucas pessoas na igreja ainda não
se contaminaram. Acima de tudo é mencionada a primeira reação ao evangelho,
"de como o tens recebido e ouvido". A palavra importante é
"como" e não "o que". Oh! Se ela tão somente pudesse
recuperar o espírito de santidade e consagração, "o como" daqueles
primeiros dias! Do contrário Cristo ameaça vir de surpresa para julgá-la, como
o ladrão na noite. O que ele descreve nestes versículos pode ser entendido como
sua vinda no fim dos tempos, como em Mateus 24:36-44, mas pode referir-se a uma
punição mais imediata. João "esperava que a vinda final de Cristo seria
antecipada em menores, mas não menos decisivas aparições". A experiência
da igreja em Sardes será igual à da cidade, a qual nunca fora tomada de assalto
e se julgava impugnável, porém mais de uma vez fora capturada em surdina.
Não há menção
do reino e do poder e da glória contidos nas outras cartas como prêmio aos
cristãos vitoriosos. Tudo o que Cristo promete aos vitoriosos de Sardes é que o
nome do vencedor não será apagado do livro da vida, de modo nenhum, e que ele
será vestido com as vestes brancas da justiça. Em outras palavras, tudo o que é
garantido aos cristãos em Sardes, é que eles serão aceitos por Deus, como para
sublinhar a possibilidade de que a igreja, como um todo, poderia até perder
esse privilégio.
Se Cristo é o único que pode ver e expor a
verdadeira condição da igreja em Sardes, ele é certamente o único que pode
lidar com ela. E ele está pronto para fazê-lo.
Ele é "aquele que tem os sete espíritos de Deus
e as sete estrelas"; e quando ele menciona juntas as estrelas, que são os
anjos representativos das igrejas, e os sete espíritos, duas coisas podem
acontecer. Os sete espíritos são os olhos de Deus de quem nada se pode ocultar;
daí procede a mensagem tão severa que acabamos de ouvir.
Eles, os espíritos, são também o poder vivificador
da parte de Deus e, em Sardes, como em todas as sete igrejas, Cristo tem nas
mãos tanto a igreja necessitada, como o espírito vivificador. Ele pode
reconciliá-los, não somente para fazer diagnóstico da situação mas para
revificar os mortos. Precisamos estar certos de que se Sardes se lembrar, e der
ouvidos, e se arrepender, ele a revificará.
CARTA À IGREJA QUE ESTÁ
EM FILADELFIA
Além de Esmirna, Filadélfia é a única igreja em que
Cristo não encontra faltas. Qualquer austeridade que pareça demasiada da parte
de Cristo não é motivada pelas faltas encontradas, e sim pelos fatos que
precisam ser enfrentados. Uma época de testes se aproxima, não certamente a
última grande tribulação que João erradamente julgava iminente, nem uma
perseguição local, o que fica evidente pelas palavras: "hora da provação
que há de vir sobre o mundo inteiro". Este teste refere-se à perene
perseguição, da qual todas as pequenas perseguições e, especialmente, a grande
tribulação, são partes integrantes. E a igrejanão tem grande força para
enfrentar esta batalha. Cristo não minimiza as dificuldades que deverão ser enfrentadas.
Ele encoraja a igreja. A igreja se defronta com uma
oposição e com oportunidades, e a intenção de Cristo é ajudar a igreja a vencer
a primeira e a confirmar a segunda.
O paralelo ente Filadélfia e Esmirna pode ser
novamente encontrado no fato de Filadélfia ter que enfrentar a oposição dos da
"sinagoga de Satanás". Para entender bem a idéia da palavra
"mentem", no grego, devemos pensar nessas pessoas como sendo
pseudo-judeus. Eles reivindicam para Si, falsamente, a glória de serem o povo
santo de Deus. Em contraste, Cristo se apresenta como "o santo, o
verdadeiro".
Ele menciona antigas profecias segundo as quais o
povo de Deus será, um dia, justificado, e o resto da humanidade se curvará
diante desse povo. Cristo diz à igreja que o cumprimento dessas profecias será
o contrário do que era esperado pelos judeus de Filadélfia: eles é que
terão de "prostrar-se aos teus pés" e reconhecer "que eu te
amei". Oh! Que os cristãos se animem, pois são os favoritos do Senhor.
Freqüentemente, no Apocalipse, João faz coro aos
outros escritores apostólicos, ensinando que os privilégios e as promessas
feitas aos judeus no Antigo Testamento foram herdadas pela igreja cristã. Esta doutrina,
bem como o seu aspecto histórico, encontra-se nestes mesmos versículos da carta
aos cristãos de Filadélfia. Uma investigação acerca do significado da expressão
"a chave de Davi" leva-nos até o livro de Isaías. Interessante notar
que encontraremos menções do livro de Isaías espalhadas por todo o capítulo 3
do
Apocalipse. A "chave" aparece em Isaías
22:22, juntamente com a promessa de que o responsável por ela, Eliaquim,
encarregado da casa de Davi, teria a mesma autoridade que Cristo tem de abrir e
fechar. Mas abrir e fechar o quê? A entrada da casa de Davi. E com que
propósito? Os portões estão abertos, diz Isaías, "para que entre a nação
justa que aguarda a fidelidade (26:2).
Assim como o próprio Eliaquim é "fincado como estaca
em lugar firme, e ele será como um trono de honra para a casa de seu pai"
(22:23), da mesma forma, aos fracos, aos desprezados e aos estrangeiros, será
dada a "minha casa e dentro dos meus muros um memorial e um nome
melhor" (56:5). As nações também virão em submissão humilde (60:11);
"todos os que te oprimiam, prostrar-se-ão até as plantas dos teus
pés" (60:14 cf 49:22, 23). Todas as idéias aqui dizem respeito ao acesso à
casa de Davi, ao reino, à cidade e ao templo de Deus.13 O que se segue pode ser
acompanhado passo a passo. O Senhor condena o legalismo dos judeus ("Ai de
vós, escribas e fariseus, hipócritas! Porque fechais o reino dos céus diante
dos homens; pois vós não entrais, e não deixais entrar os que estão
entrando" Mt 23:13) e transfere a autoridade de porteiro à igreja.
.Dessa forma Pedro e os outros cristãos têm o
privilégio de dar as boas vindas não somente aos judeus, mas aos samaritanos e
aos gentios como membros permanentes do reino (At 2, 8,10). Assim, todo
conceito expresso nas palavras: chave, porta, cidade, templo e coluna torna-se
cristão, e é a base para a transferência acima mencionada. Os judeus precisarão
aprender "que eu te amei".
Este favor não merecido é a raiz de todo o resto. Em
certo sentido Cristo guarda (ou preserva) o seu povo porque eles guardam (ou
observam) a sua palavra (v.10) e o incentivo que ele dá, tanto a Filadélfia como
a Esmirna, é dirigido a todos os que lhe são leais. Mas a cadeia de causa e
efeito vai mais fundo; eles obedecem aos mandamentos porque ele os amou
primeiro. E vai mais fundo ainda: o resultado final do amor de Cristo pela
igreja é que a igreja de "pouca força" será estabelecida como uma
coluna irremovível no templo da Jerusalém Celestial (v.12). Esta igreja será
selada de modo triplo: pertence a Deus, pertence à cidade de Deus e pertence ao
Filho de Deus. Sua terna promessa aos que se sentem dolorosamente cientes de suas
próprias fraquezas e inseguranças, é que no final eles pertencerão ao
Senhor.
Até que esse dia chegue, o Senhor os anima a
suportarem as pressões e, como não poderia deixar de ser, ao serviço. Em outras
passagens do Novo Testamento a expressão "uma porta" é figura de
oportunidade (1 Co 16:9; 2 Co 2:12); e, apesar disso, como vimos,
nestes versículos significa principalmente a segurança que eles tinham de
entrar na Nova Jerusalém; essa porta também é o único caminho pelo qual os
outros podem entrar no Reino.
Invertendo a figura apresentada por Isaías, mesmo os
judeus poderiam ser convertidos da sinagoga de Satanás. Assim os cristãos são
duplamente incentivados, pois o mesmo Cristo, que anula os opressores, amplia
as oportunidades. A porta foi aberta por ele e ninguém poderá fechá-la. É
motivo para os cristãos se animarem e usarem a força que têm no serviço que ele
lhes confiou.
CARTA À IGREJA QUE ESTÁ
EM LAODICÉIA
A arqueologia tem se encarregado de fornecer dados
bastante interessantes acerca da história relacionada com esta carta. Laodicéia
era um centro bancário e produzia artigos têxteis. Também era famosa por
produzir uma espécie particular de colírio. Era também uma estância
hidromineral de águas mornas que vinham de fontes próximas à cidade. Assim as
palavras de Cristo à igreja contêm uma confortável mensagem, bem apropriada.
Mesmo que não tivéssemos o conhecimento arqueológico, ainda assim não teríamos
problemas em identificar o juízo que Cristo faz da igreja. "Quem dera
fosses frio ou quente!" Que condenação pior poderia existir para uma
igreja do que o Senhor dizer que preferiria um cristianismo mais frio do que o
encontrado efetivamente em Laodicéia.
Em outras cidades da Ásia temos observado que o
estado da igreja geralmente corresponde ao estado da cidade. Em Laodicéia,
entretanto, isso não se repete; há um contraste entre a cidade e a igreja. A
igreja é a imagem da cidade revertida como em um negativo. Financistas, médicos
e fabricantes de tecidos se encontram entre os cidadãos mais notáveis da
cidade; porém a igreja é considerada "miserável, pobre, cega e nua".
"Laodicéia tinha falhado no propósito de encontrar em Cristo a fonte de
toda a verdadeira riqueza, esplendor e visão. "
A indiferença de Laodicéia é a pior condição em que
uma igreja pode sucumbir. A situação de Laodicéia é pior que a de Sardes onde,
pelo menos, existia um fio de vida. A única coisa boa em Laodicéia é a opinião
da igreja sobre Si mesma e, ainda assim, completamente falsa. Ela tem a
pretensão de ter todas as coisas, mas na realidade não tem nada. Devemos
lembrar-nos de que em 1:16 há sete estrelas na mão de Cristo. Nós até podemos
duvidar se ela era uma igreja verdadeira. Será que a linguagem de Cristo
deveria nos chocar? É difícil pensar assim, frente ao descrito no versículo 16:
"Estou a ponto de vomitar-te da minha boca". É o Amém, a Testemunha
fiel e verdadeira que profere estas palavras, e elas são uma parte de todas as
outras ameaçadoras escrituras que falam do Senhor, desgostoso com essa geração
(Sl 95:10) e zombando dos homens (Sl 2:4).
Apesar disso Laodicéia tem uma chance. O fato de ser
repreendida é uma prova de que o Senhor a ama; a ameaça de abandono total, caso
ela não se arrependa, é contrabalançada pela promessa de reestabelecimento
total, caso ela se arrependa. Por causa dessa igreja desastrada, o Senhor se
apresenta, como "o princípio da criação de Deus, aquele que é capaz de
descer até o caótico abismo do fracasso de Laodicéia e restaurá-la, assim como
um dia ele fez com o mundo.
Isso só será possível se ela quiser. A soberania divina
não é, de modo algum, prejudicada por isso. Cristo é o único que pode
providenciar as riquezas, as roupas e o ungüento; ele é a voz persuasiva que
aconselha Laodicéia a aceitar a oferta. Ele é o que vem, o que permanece, o que
bate, o que chama. Sua soberania está implícita no fato de ele ser "a
origem da criação" de Deus, verdade esta que a igreja de Laodicéia já
conhecia através da carta de Paulo aos Colossenses (Cl 1:15-18; 4:16). Mas a
pergunta crucial para a igreja é se ela abrirá a porta e deixará Cristo
entrar. "Pois a única cura para a indiferença é a readmissão do Senhor
excluído. "15
Mesmo que a igreja seja surda à chamada de Cristo,
ele ainda assim se dirige a cada um dos membros individualmente, pois
"quando Cristo diz: Eis que estou à porta e bato, se alguém... é
clara a sua intenção de dirigir-se ao indivíduo. Mesmo que a igreja, como um
todo, não dê ouvidos à sua advertência, pode ser que um indivíduo o faça.
"16 A todas as pessoas de Laodicéia que apresentarem evidências de
arrependimento, o Senhor promete, uma majestosa recompensa: "Ao vencedor,
dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono, assim como eu venci, e me sentei com
meu Pai no seu trono."